Para mudar o mundo, começa por mudar o teu vocabulário
Não digas mais, por exemplo, "venha, tomemos juntos um café";
Diga que iremos nos abstrair do mundo sôfrego, ingrato
mediante a fragilidade das coisas
e sobre a efemeridade da tua própria vida
igualmente sôfrega e igualmente efêmera
e me falas da tua simplicidade máxima
enquanto sorves um café.
Teu vocabulário necessita da tua vontade verbal;
precisa ter a descoberta inesgotável e férrea
da criação dos novos sons
e de novos códigos que te restaurem
o que te foi um dia uma visão
Para falar das tuas tristezas, usa verbos impensáveis
como "espraiar"
(haveria verbo mais etéreo do que espraiar a dor,
deixá-la pulsante, dentro do ritmo de onda,
até que cesse sua força, esparramando-se, frouxa,
a lamber alguma tábua de ar?)
E ainda sobre as tuas necessidades de amor...
ressurja com criações sutis e desaqueixosas
falando de morte e de renascimento
que é o que somos,
e é só o que deixaremos.
Por fim, quando tiveres descoberto
que a palavra transforma
e que a palavra também desmonta
os reinos, e os reis que os criou
põe fim ao teu sofrimento de observar a rigidez do acaso...
Se por tua vez, conformadamente, te modificares
terás modificado o que te assoberbou.