31 October 2010

AMOR À SABEDORIA



Amo a sabedoria;
e como naqueles contos irreais
quanto mais amor, 
mais devotamento 
e mais  lonjura

26 October 2010

PUBLICAR LIVROS



Quero me dedicar a fazer um livro de pinturas. Não sei pintar, mas e se eu me esforçasse? E se de repente eu fosse a papelaria hoje a tarde comprasse uma caixa de giz de cera e um livro de colorir? Podia ir treinando nas coisas de criança e depois passaria para o "advanced" já no ano que vem (sempre fui  ultra rápida para aprender, creia-me).
Pensei um fazer uns poeminhas pueris e ao lado dele, uma pintura esmaecida de cera... daí é achar uma editora e colocar o livro em frente.
Penso tanto em publicar livros, seria  todo mundo assim?
Se estou numa livraria, não olho com cobiça os livros expostos, mas procuro os meus (que infelizmente, estão ausentes, mas será por pouco tempo?).
Na verdade, quando se é escritor por dentro e por fora, nada importa se você publica ou não publica regularmente; o que importa é o que o livro que está dentro da gente já foi publicado em nosso rosto e nos gestos das nossas mãos, diuturnamente, e tudo está ali revelado para quem convive com a gente.
Os meus livros, aqueles que ainda não escrevi, já estão em mim e doidos para ganhar a rua...
As prateleiras das livrarias estão minha à espera.
Resolvi;  vou a papelaria ainda hoje.

20 October 2010

A SUSTENTAÇÃO





Vi a ararinha verde por sobre o portal
descansando a sua liberdade.
Dezenas vieram,
todas individualmente libertas.
E eu, que amo a liberdade,
que mais que a liberdade,
amo a essência,
arvorizei-me para sustentar as ararinhas
e a elas, proteger,
como protejo a mim mesma.

13 October 2010

AS ROUPAS NOVAS DO IMPERADOR


Andersen escreveu este conto há muito tempo, traduzido em muitas línguas e espalhado para todas as partes do mundo. Trata-se de um imperador muito vaidoso, convencido por dois falsos  tecelões de má fé a usar roupas que seriam  invisíveis somente para as pessoas incompetentes ou mal preparadas para suas funções. Para este trabalho, o imperador prometera aos malandros uma alta soma de dinheiro e ainda algumas jóias do reino para que eles confeccionassem  roupas imperiais com  os mais finos tecidos do Oriente, nunca antes vestidos por um imperador!  Extremamente detalhista, ele ordenou que dois vigias fossem lhe reportando o progresso da confeção de suas roupas a medida que o tempo passava. Os vigias vinham com todos os tipos de detalhes: "Estão ficando maravilhosas, senhor! Tem brocados e finos tecidos azuis!"O rei se satisfazia, felicíssimo... Até o dia que as roupas ficaram prontas. No momento de vesti-las, houve um punhado de gente para testemunhar as mais finas roupas que um imperador havia usado em todo reino e em todos os tempos!  Sendo assim,  os tecelões vigaristas iam fazendo de conta de que estavam vestindo roupas delicadas no corpo do imperador, até que finalmente anunciaram que o lindo  traje já estava composto em seu corpo. O rei  encontrava-se completamente desnudo, no entanto,  todos  ali presentes se entreolharam, fizeram um coro uníssono em "Ohhhhhhhh, que lindo!"  mas ninguém,   de seu séquito teve  coragem de denunciar o fato.  Para celebrar este grande momento, uma gloriosa passeata pela cidade  foi organizada  a fim de que que a plebe também tivesse  oportunidade de ver um imperador assim tão bem vestido.  Nem bem o imperador ganhou as ruas montado em seu cavalo branco, uma pequena multidão se acotovelava para ver melhor aquele que seria a figura mais importante do reino. Eis que da primeira fila, um garotinho leva as duas mãos sobre a boca e exclama: "Oh! O imperador está nú! " e sendo assim, toda farsa foi ao vento, revelada.
Em inglês,  usa-se essa expressão "As roupas novas do imperador" (the emperor's new clothes)  quando se  quer dizer que uma grande maioria, mesmo discordando de uma situação, apoia coletivamente um fato, apenas para não parecer ignorante ou  por não ter coragem de sustentar um argumento contrário.
Por que escrevi essa crônica hoje? Bem, as eleições para o 2o. turno estão chegando e ando meio cansada de tanto e-mail  lotando a minha caixa de entrada,  me pedindo para rever a vida da Dilminha Paz e Amor ou a integridade biográfica do Sr. Serra... Os fatos estão aí, consigo vê-los sem que me ajudem, portanto, deixe-me votar sozinha e tranquila dentro da minha santa consciência;  forçar a barra agora nos últimos instantes me fazendo ver isto ou aquilo que para mim não existe, certamente, é usar as roupas novas do imperador.
E tenho dito.

11 October 2010

THE LONG AND WINDING ROAD





Para mim, a canção mais tocante dos Beatles em nada lembra  a ingênua  Yellow Submarine. Falo da lindíssima  The Long and Winding Road,  escrita por Paul McCartney e creditada também a John Lennon.  Além de apresentar uma letra madura, forte, inquietante,  possui uma incrível sonoridade crescente, começando em um tom mais baixo enquanto vai ganhando corpo  ao falar de umas coisas assim: "A estrada  sinuosa e longa  que me leva à sua porta jamais desapareceu, pois já vi esta estrada antes... ela sempre me traz até aqui, até a sua porta...."

Inventamos a porta quando resolvemos fechar o coração. Os animais silvestres também o fazem, embora não erijam portas físicas, mas entocando-se, fugindo do predador.Nós, seres humanos, possuímos infinitos predadores e até de amigos escapamos!
Mas o que me comove nesta canção dos Beatles é a  figura de uma estrada longa e sinuosa que leva à porta de alguém, e nesta imagem  esse alguém nem sempre disposto a abrir sua porta para  receber ali a nossa presença, dando-nos a proteção e o calor da alegria e da amizade. Uma estrada que conduz a uma porta, a canção diz isso, que para cada um de nós deve haver uma porta no final de uma estrada, mas a canção não ilustra esta porta aberta, apenas sugere  que ela deva ser aberta com alegria  no momento da nossa chegada...

Arthur Miller disse em "A morte do caixeiro viajante" -" O mundo é uma ostra,  mas não se quebra uma ostra com punho de renda" - ou seja, para ele, o mundo é oclusivo e duro;  para conquistá-lo, só com a violência dura, estúpida. Mais uma vez, os animais silvestres( me ocorre a semelhança dos animais silvestres com a nossa falta de amizade); como eles, também nos escondemos atrás de portas em busca de proteção contra as intempéries que inclui o predador.

A noite selvagem e tempestuosa  que a chuva lavou deixou uma poça de lágrimas chorando pelo dia... Porque me deixar parado aqui? Mostre-me o caminho!
Estive sozinho muitas vezes, chorei muitas vezes, de qualquer forma, você nunca saberá os caminhos que tentei, mas ainda me levam de volta à estrada sinuosa e longa... Você me deixou parado aqui muito tempo atrás... não me deixe esperando, leve-me até a sua porta...

Nunca como antes essa súplica da canção me comoveu tanto quanto me comove nesta noite fria; hoje venta como o diabo e o frio está passando por cima do telhado.  Preciso hoje que alguém me abra uma porta, penso que tenho a estrada mas não vejo porta nem entrada. Precisaria remover de mim a necessidade para também abrir a minha porta que me traria a condução de alguém, mas este alguém nesta noite, enviesou-se para outro lado, para outras portas, para outras estradas que nem sei...

A canção não fala de muitas estradas; fala de uma apenas, "sua porta" . Hoje falo  da ausência desta porta, desta estrada e só me fica essa linda canção sugerindo companhia, aconchego, abrigo...
The Long and Winding Road ainda é a canção que me faz pensar na humanidade. Temos tudo, mas na verdade, não temos quase nada, e o do pouco que temos, portas fechadas.



10 October 2010

FIQUE COMIGO BELEZA, PORQUE O FOGO ESTÁ MORRENDO...

Sempre me lembro da frase de John Masefield em "Um livro de duas espécies: Envelhecendo": Fique comigo, beleza, porque o fogo está morrendo".  
 Masefield situa o fogo da juventude bem  ao lado da  força da beleza ; a extinção de um leva ao abandono da outra, que com o fogo do vigor entranha a individualidade da  beleza, o diagnóstico de uma felicidade etérea, passageira, fugidia, porém tão desejada.

Escrevo  hoje para todas as mulheres, que como eu, estão envelhecendo.
Fique comigo, beleza, porque o fogo está morrendo... e morrendo está o fogo que nunca jurou ser fátuo, o fogo alto, combustado de duplas cores, ora o vermelho apaixonado, ora o azul belo, sensual, carnal, da velhice afastado...
Fique comigo, beleza... porque me morre a pele acentinada, me morre o canto dos olhos que eu pintava de preto e de dourado, me morre o bater dos cílios grossos, da pintura de Cleópatra na cara... Fique comigo, beleza... porque me morrem os brilhos dos cabelos, os fios esticados dos rabos de cavalo, pura crina e puro chiado quando eu os jogava para cima e para baixo...
Fique comigo, beleza, porque o fogo está morrendo, e se morrendo se extingue, de que modo andará a minha cara marcada? Dentro do livro de um neto, marcado para marcar  página? Está morrendo, beleza... então fica ao meu lado... tinge de negro meus atuais fios finos de tão alvos, sobrancelhas deformadas, nariz adunco que o chão encara, pernas de manchas várias.... fica comigo, beleza, porque o fogo está morrendo... não morra mais do que o fogo que já me morre mais do que a graça.
Uma mulher sem o viço da beleza apenas possui duas personalidades: uma  é o benfeitor espelho verde dos anos passados  e outra é o delator do  espelho negro do murchado.
Assim, fique comigo beleza, porque o fogo está morrendo... e não me venha, beleza, falar-me da sabedoria dos anos que o fogo quase extinto deixou-me  por legado... fique comigo, beleza, que sabedoria da pele fresca é a melhor de todas as sabedorias: ao mesmo tempo que não ensina, nos exata.
Fique comigo, para que o pouco fogo  que ainda vive  nunca se apague,  e para que dentro dos nossos olhos ainda brilhe aquela faísca erótica de asseio e plástica.
A despeito de minha inteligência, desta minha bravura, das tempestades enfrentadas em meio aos filhos hoje adultos que alimentei, das intermináveis jornadas, das mesas postas às moles  papas, do colo quente  às sexuais noites selvagens, é ainda o fogo significativo da beleza o que me faz olhar para trás e me faz orgulhar das minhas pegadas...que vá o fogo frágil, mas fique comigo, perseguida beleza ... até que a vida se acabe.

A NOSSA DIFERENÇA




A diferença entre tu e eu:
eu miro nos passarinhos
no meu alçapão, tu miras.
No resto, somos iguais
igualmente caçadores 
daquilo que não nos pertence.

09 October 2010

EM DOIS DIAS



Sairemos do casulo,
Ceci e eu.
Em dois dias,
Ceci será a máxima miragem
e eu serei aquilo que Ceci me propôs;
a libérrima liberdade da imagem.