31 July 2011

ANTES




O que era antes foi o antes.
O antes é uma palavra absurdamente suicida;
quis ser e já se foi.
O que é agora é coragem.

DO QUE FALO




Falo de coisas simples para libertar as complexidades.
Do que sou, não sei  muito ainda
mas sei do que fui.
E naquele tempo, tampouco sabia muito;
verossivelmente nada.
Foi preciso que as minhas primaveras se juntassem,
uma após as outras,
que as folhas verdejassem, depois caíssem,
e que o frio chegasse, que o verão torrasse;
foi preciso o suor ácido por cima da testa
e foi preciso descanso de mártir quando a guerra acaba
para que eu me tornasse uma criatura sapiente e calada.
Mas do que eu calo, falo,
e agora já nem sei do que falo.


24 July 2011

O TERÇO




Para rezar o terço,
diminuí meu nome
que é tão extenso,
esse meu grosso nome...
Para rezar o terço,
diminuí meus braços,
que são tão extensos,
esses meus fortes braços...
Para rezar o terço,
diminuí os versos
e só falei de anseios,
de pedir perdão,
para murmurar as faltas
e eram tão ricas as minhas palavras!
Para rezar o terço
falei de mim
e quando falei de mim
reduzi-me a nada
Só a divindade espia
quando o terço cria
a linha de pecados
que a corda que expia.
Para falar de mim,
fugi de de mim
falei do terço
que arrebata,
e que acolhe
o meu nada,

23 July 2011

CANÇÃO DA PITANGA


O gosto da pitanga por debaixo da chuva fria,
o estremecer dela,
o anúncio da acidez e da doçura quando estia,
o ar fresco que morde a fruta
e o círculo vicioso da gratidão
ante o belo, o inevitável e da natureza, o grito.
Comer da fruta e digerir a vida.

21 July 2011

CANÇÃO DO TÉDIO



Oh, lenço amarrado ao pescoço que és tu, vida!
Assenta-me bem, mas que desconforto
em meio a este calor de fracassos e cismas!

19 July 2011

O TÍTULO DA ROSA


Este é o título da rosa que me destes: o desespero;
e este é o meu suspiro pela morte da rosa.
Viveu em si, vibrou-se,
adquiriu a cor escarlate de seu clímax
para depois enfiar-se no túnel escuro
e estrebuchar de dor e arrefecer-se.
O desespero angustiou-me a fala
quando a rosa seca já tinha
o único significado ao qual  se permitira.
Então, o título foi outro: o alívio.

12 July 2011

BASTA-ME



O telefone está tocando lá embaixo
e eu me zango.
Para bastar-me, basto-me
e para só viver,
somente vivo.
Eu, este meu lado triste,
aquele meu ar alegre,
com minha companhia
austera, honesta,
insuportavelmente descritível.


11 July 2011

BELEZA

Achar beleza dentro de si mesma;
contar as belezas,
como se contasse as múltiplas tristezas;
e mais do que beleza,
achar aquilo que nos faz perfeitos
depois de nos terem tirado
a beleza, a beleza e a beleza.