24 July 2009

TRISTE


Ando tão triste, meu amor, tão triste...
Ah, se aqui houvesse cotovias e largos prados
onde eu estou e choro...
Ah, se as cotovias cantassem,
e se os largos prados verdejassem...
Ah, se a vida fora uma cantiga ritmada,
longa, de ninar os espíritos revoltados...
Ando tão triste, meu amor, tão triste,
que a minha tristeza é um mar calcificado,
que a tudo ofende, e a tudo cala.

23 July 2009

QUE HAJA POESIA


Que haja poesia em tudo que virmos
do hálito fresco da menina
até o som reverberado do trompete que ecoa no terceiro andar
chorando as lágrimas universais em notas graves.

Que haja poesia dentro de ti,
dentro de mim,
dentro da casca de noz que foi esquecida por sobre a pia.
A poesia só necessita de um olhar,
e o pouco do esforço de alma para libertar-se
e adornar aquilo que teu olho vê
de comum, de pobre e de defeito.

20 July 2009

O AMOR NÃO MORRE SÓ


O amor não morre só,
morre com as substitutivas da intolerância
e morre também por si só,
no bafejar do destino
entortando as linhas de nossas mãos.

Tanto eu dizia, ama-me,
mais eu sabia, conforta-me
e o que eu entendia de destino
virou o que eu agora sei de solidão

JURO-TE


Juro-te que não morrerei amanhã

porquanto haja um posto vazio

a ele, filiarei o meu coração.

Se tenho saudade, é que na saudade já morri

e se tenho esperança,

é porque na esperança

etérea e grata,

estarei na lida de garimpar

o ouro de uma lavra desconhecida,

o qual seja, um amor difuso,

um luto ao contrário do que vivi

e que me acorda para a vida.

13 July 2009

METÁFORAS PARA QUEM ENTENDER DE METÁFORAS


Já tive um burro, um cavalo e um piolho
Nenhum deles me deu tanta alegria
quanto o dia que me descobri sem eles.

O cavalo relinchava bobagens,
eu chorava só, sem companhia.
O burro nunca compreendeu a grandeza da vida
e o piolho foi quem atormentou-me madrugadas inteiras

Agora tenho dois gatos aqui dentro,
um para o descanso,
e o outro, para o descaso.

11 July 2009

VAZIO


O amor deve ser um vazio que esteja sobre todas as coisas,
não conhece o ritmo dos comuns
, não come arroz,
não arremata pontos,
antes, distorce-os,
e ignora a sapiência da tabela periódica.
Porquanto houve um vazio, amei
antes que os vazios pudessem ser preenchidos,

numa necessidade natural de substituição

O amor quando aglutinado, salta fora pela janela,
e vai procurar outros caos,

outras possibilidades de falta de explicação.

Deixa de ser amor o que a gente resume numa linha:

Amei, mas foi-se.

09 July 2009

AUTO RETRATO


Sou prematura de sete meses,

Faltou-me no acabamento

paciência, humildade e coragem.

Tenho um nome de santa

De santa eu não tenho nada;

Não como ovo, não como frango

Não tenho ciúme de coisas

Nem de nenhuma alma

Digo todas as verdades com convicção

Não me importa se me adulam

E todas as minhas verdades

nem sempre são verdades.

De generosidade, cultivei pouco

e colhi pouco;

Falo muito, sofro de frio nos pés

A minha vaidade não me permite errar

Mas erro sempre que posso

erro de monte quando não posso.

Não tenho saudades do passado;

Serei espiritualista até morrer,

E depois que morrer, serei materialista

Gosto de viver fora da concordância do mundo,

Penso grande e ajo pequeno

Minha língua me trai.

Desdenho as pessoas patriotas,

Acho que o mundo é pequeno demais

e que meu peito sonha muito.

Tenho vícios, os quais me adoram,

Posto que minha dedicação a eles é extrema

mas tenho comportamentos que eu exumo

Porque me são complacentes, e eu não os rejeito.

Falo alguma coisa em algumas línguas

mas é a minha própria língua que me desafia

Nunca soube contar direito;

A matemática desistiu de mim;

Não sei cozinhar como devesse,

Engano as panelas,

mas elas nunca me enganaram.

Falo pelos cotovelos o que não quero

Tudo o que digo subtraio por dois,

O meu espaço geográfico é fraco

Não gosto de andar por aí,

Gosto de ficar comigo mesma

e as pessoas me cansam

com aquelas palavrinhas de mesma coisa.

Nasci cansada

e para todas as coisas do mundo

incluindo o que existe

e excluindo o que não há,

ainda estou deveras cansada...





08 July 2009

POEMA PARA A VIDA


Não é que eu não queira falar de flores,
mas é que as reles rãs, as asquerosas
também em mim ocupam espaço,
não quando estou triste, deprimida
mas quando estou alerta e acordada.
Não seriam elas que me lembram sempre
que essa vida é feita de charco enlameado?

POEMA DO FERIADO


Amanhã é feriado,
portanto, flores, não se abram!
Jornais, não me contem novidades!
Poeiras, acalmem-se!
Quero comemorar tranquila
o que necessita ser comemorado
que seja a minha poesia,
aqui bem dentro de mim,
nos meus pequenos guardados.

POEMA DA MINHA CUMPLICIDADE


Deve existir um amor que não nos saiba mentir
que nos sossegue no intimo e publicamente,
que nos dê a antevisão do fim
e a necessidade de revisar o começo.
Deve haver um amor que saiba amar completo;
aquele que vê o errado e o ignora
consoante o olho bom do amor perfeito.
Esse amor nunca será meu;
não serão para mim os ardores benéficos
que do generoso, estende a mão aberta
e do benevolente, a sistemática reserva.
Serei eu somente
e meu amor desamparado e ermo,
que na cumplicidade de mim mesma,
não me confunde nem me mente.

07 July 2009

VIRTUOSE


Já é tão noite
e desejo observar um rio que possa passar.
Imagino como estará frio à beira desse rio.
E se os movimentos das águas forem para o norte
me sentirei feliz,
se aquelas águas rumarem para o sul,
mais feliz me sentirei
porque compreenderei
que a despeito da inércia que existe aqui
deve haver um barulho que anda
e um trator de águas
que em seu mote, não pára
levando a vida apinhada de sorte.
Pois o que vivo é leviano e pobre
que pressente e busca

o que devesse ser a virtuose.

AFRICA DO NUNCA


Houve um tempo que eu quis me chamar África
por ser o nome mais inequívoco
e fricionado que conheço

África nomeia uma mulher redonda,
de quadris largos,
peitos arfantes e colares
caindo por sobre um ventre comunitário,

generoso, amante...
Uma mulher de pele grossa,
humores alterados
de pisadura forte e nua;
uma mulher com feitura de mulher,
mas com a preventiva coragem selvagem

daquela que guarda em dentes suas armas
que esconde o leite no entre das virilhas
que sua gostoso debaixo das palhas,
que fala alto e que também não fala nada.
Não me chamaram de África,
nem de louca, nem de sereia das águas;
chamaram-me por nome de santa.
Apenas por isso,
carrego em meus lombos estreitos um mosteiro vazio

e em minhas partes íntimas, um mantra
que chama e chama.
Santa, santa,
de que matéria te fizeram eles?
África do nunca,
qual matéria tua ele me tomaram?

06 July 2009

RELEXÕES


... e para ser a boa companheira,
a boa irmã, a boa filha
aquela que contempla as intolerâncias e as sublima
fiz-me de muda e fiz-me de morta.
O que venho conseguindo, a duras penas
é uma personalidade amorfa, abafada, de perna manca
que me obriga a me perguntar o que seria melhor:
uma existência plena de verdade que dói e que se esbarra
ou uma vida em imposturas, remontada?
o que é verdade para mim,

é luz de lumeeira que eu acendo, atônita;
na lumeeira alheia, a farsa que abobalha.

01 July 2009

PLEONASMO




Eu faço uma poesia desprentensiosa, simples,
numa vaidade pouca
e de cores pálidas.
As palavras complexas, refinadas,
buriladas e inventadas
nunca vêm a mim...
Talvez porque eu seja a minha própria complicação
e disso resultaria um pleonasmo.